A feira para venda de peixes, frutas e verduras acontecia em um terreno empoeirado. A cada passo da caminhada sentíamos a areia fina de tons avermelhados
entrar em nossos calçados. Crianças, cachorros e porcos, pintados nos mesmos tons da areia fina, circulavam livremente em meio a feira. O riso e os gritos das crianças podiam ser ouvidos à distância e se confundiam com os gritos dos vendedores de peixe fresco, que acabara de chegar na feira.
Com o olhar cansado e sorriso no rosto, as vendedoras ficavam alegres ao observarem a chegada de clientes estrangeiros, para efetuarem suas compras. Ao
cumprimentá-las, dizendo boa tarde, elas sempre davam a mesma resposta dizendo “obrigada”.
Aquele era um belo entardecer sob o pôr do sol africano, no ano de 2011. Os tons de laranja avermelhado embelezavam o céu com uma exuberância única, vista
daquele lado do continente. Minutos antes, vivenciamos uma cena que eu jamais iria esquecer. Aquele foi um dos momentos mais significativos e dolorosos de minha vida. Enquanto caminhávamos em direção a feira, observei ao longe, o frágil menino solitário. Ele estava ali em meio paisagem composta pelas casas em tons de areia, cercadas de lixo e porcos caminhando livremente pelos quintais. A areia fina cobria parte de seu corpo sujo e nu. Meu coração disparou ao perceber a situação daquela criança.
Caminhamos aproximando-nos lentamente do menino apelidado de Beja. Lembro nitidamente o momento em que me abaixei em sua direção e fitei diretamente
em seus olhos. Peguei em sua frágil mãozinha. Ele tinha aproximadamente três anos. A saliva escorria de sua boca entreaberta, seu corpo nu coberto de poeira revelava abarriguinha inchada, os pés descalços e a fome, mostravam a situação de abandono.